Fevereiro - Capítulo Seis

Chegou agora? Para acompanhar esta história do começo, clique aqui.



Ângela andava de um lado a outro, mas não recebera nenhuma notícia. A garota não fora encontrada em parte alguma. A maré iria subir, portanto, ela precisava já estar no local informado pelo poema.

"O falo de Netuno, só pode ser um lugar!"



Olhou para a grande torre em forma fálica, construída pelo artista plástico mais famoso do Recife, e às vistas de todos no litoral do Recife Antigo: a torre de Brennand, gigantesca. No poema, a expressão Falo de Netuno só podia estar se referindo a ela.



A garota que representava a cor azul só podia estar em algum lugar próximo à oficina Brennand, muito próximo à escultura fálica. Mas seus mergulhadores nada encontraram.

"Acalme-se, Ângela!" disse Márcia, que já havia voltado e acompanhava tudo de perto. Estavam de pé, no Marco Zero, olhando para a torre do outro lado o braço de mar, que erguia-se majestosa. "Vamos nos concentrar. A garota do fogo disse que ele estava usando uma máscara de papangu, e também disse a palavra 'saudade'. Esta noite teremos o desfile do Bloco da Saudade, aqui no Marco Zero. Talvez seja uma pista, ele esteja usando esta máscara hoje."

"Eu não sei, Márcia. Tenho medo de, por negligência, essa moça morrer."

"Já sabemos o local, os mergulhadores estão fazendo o trabalho deles. Vamos, você ainda tem muito para descobrir."

Um ruído de estática foi enviado pelo rádio, e em seguida, o delegado adjunto entrou em contato.

"Ângela, o carnavalesco está aqui."

"Estou indo para aí."

Quando chegaram na delegacia, foi direto para sua sala. Precisava interrogar o seu principal suspeito.

***

Já estava cansada. Ângela e o delegado adjunto estavam interrogando Marcus há horas, mas ele não cedia. Não importava o que perguntasse, não havia provas concretas contra ele, e ele não lhe dava nenhuma pista.

"Sim, eu contratei a moça para alegrar meu camarote, mas foi só isso. Eu não estive com ela lá, eu estava muito ocupado!" disse Marcus.

"Não viu nenhuma pessoa aproximando-se dela próximo ao horário em que ela caiu?"

"Eu já disse, delegada. Eu estava ocupado demais! Você sabe o que é organizar um camarote vip no dia do Galo da Madrugada? É um horror!"

Não adiantava. Nada do que perguntasse surtia efeito. Não podia mantê-lo preso mais tempo.

"O que vamos fazer agora? Esperar? Não faz sentido!" conversou com Medeiros a um canto.

"Vá descansar, eu tomo conta da investigação por hoje. E você ainda pode voltar à noite para irmos atrás do papangu."

"Eu vou ficar por aqui mesmo", disse ela. "Mas vou descansar. Qualquer coisa, não hesite me chamar."

Liberaram o carnavalesco, mas ele estava sob vigilância.

"E consigam um mandado. Quero saber se ele tem em seu camarote ou em sua casa, seu atelier, o que for, se ele tem máscaras de papangu com o tema do Bloco da Saudade, ainda esta tarde."

Ao sair, encontrou Márcia no corredor.

"Alguma novidade dos mergulhadores?"

"Nada, Ângela." Ela lhe ofereceu uma xícara de café, à qual aceitou de bom grado. "A maré está cedendo. Vai encher novamente amanhã de madrugada."

Ângela suspirou. Não havia nada a fazer neste sentido. "Quero que se revezem com outra equipe e continuem procurando. Quero também que vigiem as entradas para a oficina e todos os barqueiros que fazem a travessia. Se ela não está lá, uma hora o assassino vai ter que aparecer pra colocar a garota no local. E se isso acontecer, quero ele preso imediatamente."

E saiu para uma sala de descanso.

***

A noite caiu, e com ela o desespero. As horas se passavam, e Ângela estava cada vez mais apreensiva. Era noite de carnaval, na segunda-feira, e desde a madrugada do sábado não ia para casa. Estava cansada, mas determinada.

Era quase a hora do desfile dos blocos antigos de carnaval, e ela já estava à postos com uma equipe tática próximo ao local. Todos estavam à paisana, e se misturavam com os foliões.

"Posição dois, informe."

"Sem papangus."

"Posição três."

E assim, Ângela verificou todo o perímetro, mas até aquele momento, ninguém apareceu com máscaras de papangus. O Bloco da Saudade estava próximo de chegar, e então, uma transmissão.

"Ahn... delegada?"

"Informe."

"Encontramos papangus no meio do Bloco em questão."

"Quantos?"

"Muitos..."

Ela foi na direção indicada, e viu. "Não acredito."



Quase todos os participantes do desfile pelo bloco estavam usando máscaras de papangus, com as cores do Bloco da Saudade.

"Parece que estão homenageando os papangus de Bezerros no desfile deste ano..." disse um dos agentes, e Ângela quis gritar.

"Vamos. Procurem alguém mais jovem, que tenha força suficiente para arrastar uma mulher de porte atlético, como as passistas, e que esteja com a máscara. Não descartem ninguém com este perfil. Pode ser um homem ou uma mulher. Andem!"

Ângela observava de longe, em seu posto, enquanto seus agentes infiltravam-se no bloco e procuravam. Pediam para retirar suas máscaras, mas algumas pessoas se recusavam. Naquele ano havia muitas mulheres idosas no desfile, sendo descartadas de imediato.

"Parece um desvio de atenção..." conjecturou Ângela, ainda observando. Foi quando alguém lhe chamou a atenção.

Entre os que estavam no bloco, uma pessoa, alta, vestindo uma roupa larga de papangu nas cores do bloco, e com a máscara característica, estava parada entre os passantes, e parecia olhar diretamente para ela. Ela encarou o personagem, mas ele não desviava o olhar. Então, virou-se e misturou-se à multidão, afastando-se do bloco.

"É ele! Está indo a seis horas do bloco, direção à ponte Maurício de Nassau! Andem, ele está fugindo!"

Correram, e seus agentes o seguiram. O papangu corria, desviando-se de foliões desavisados e de barracas de comida e bebida. Estava quase chegando à ponte, quando foi parado por dois agentes. Ângela chegou e tirou-lhe a máscara.

"Mas o que..."

Olhos de medo a encaravam de volta. Era um homem caucasiano, e parecia estrangeiro, com cabelos muito louros e olhos muito claros. A pele do rosto estava queimada de sol, num tom avermelhado forte. Acima de tudo, o que chamou a atenção foi que ele estava com uma fita adesiva na boca. Ângela arrancou-a, e ele cuspiu um saquinho plástico, ao qual Ângela pegou.

"Please! Please! Eu não ser Brasil! Tourist! Help me!"

"Ok, ok! Stop!" Ângela tentou acalmá-lo. "What happened?"

O homem começou a falar num inglês britânico e bem explicado.

"Um homem me pegou de manhã e me prendeu. Ele estava armado! Eu pensei que ele queria dinheiro, mas não me assaltou. Apenas mandou que eu estivesse aqui neste horário, usando essas roupas. Ele me disse que se eu tentasse fugir, atiraria em mim!"

"Ele está aqui?"

Ângela olhou para todos aqueles prédios que circundavam o lugar onde estavam. O assassino podia estar em qualquer uma daquelas janelas, à espreita.

"Ele disse que estaria, e que eu deveria fazer o que ele disse."

"E o que ele disse que era para você fazer?"

O inglês tirou de um bolso uma fotografia. "Eu deveria localizá-la e fitá-la, chamar sua atenção e correr para a ponte. Eu tinha que tentar fugir, mas ele sabia que iriam me pegar, por isso o bilhete na minha boca."

O rosto na fotografia era de Ângela. Ela olhou para si mesma, lívida. Aquela foto havia sido tirada nos arredores do Shopping Paço Alfândega, antes que ela entrasse no estabelecimento para salvar a passista amarela.

Rasgou o saco que estava na boca do inglês e tirou de lá um pedaço de papel.

TIC TAC

"Mas o que significa isso?"

Ela olhou na direção do Marco Zero.

"Equipe da água, informem!"

Ela estava quase histérica. Ninguém respondeu.

"Merda!"

"O que foi?" perguntou Medeiros.

"A equipe designada para vigiar as entradas da oficina Brennand. Nenhum deles responde."

Correram em direção aos acessos da oficina. E encontrou um de seus homens morto na entrada de barcos.

"Espalhem-se! Quero informações de cinco em cinco minutos! Vai!"

Ela foi uma tola. A máscara de papangu foi apenas uma distração, para afastá-la, juntamente com seus agentes, do Marco Zero. Algo aconteceu ali, e provavelmente a moça já estivesse pronta para morrer em algum lugar do braço de mar.

"Acione a equipe de mergulhadores!"

"Está de noite, não há buscas durante a noite!"

"Ela está aqui! Eu tenho certeza! E a maré vai encher de madrugada! Ela vai morrer! Procurem!"

O desespero tomou conta da delegada, e o medo de ver mais uma mulher morta naquele carnaval a dominava. Precisava chegar antes, precisava salvá-la.


Voltar ao Capítulo Cinco        -        Capítulo Sete

Share this:

JOIN CONVERSATION

    Blogger Comment

0 comentários:

Postar um comentário